Um jornalista cabo-verdiano lançou um livro sobre o campo de concentração do Tarrafal. "Tarrafal - Chão Bom. Memórias e Verdades", assim se chama o livro: dois volumes, mais de 600 páginas, a partir de entrevistas com 45 ex-presos do campo, editado pelo Instituto de Investigação e do Património Culturais de Cabo Verde.
Criado em 1936, o “campo da morte lenta" (como ficou conhecido) começou por receber antifascistas portugueses, sobretudo comunistas e anarquistas. No total foram 340, dos quais aí viriam a morrer 10% - incluindo o secretário-geral do PCP, Bento Gonçalves, e Mário Castelhano, líder da central sindical anarcosindicalista, CGT.
Encerrado por pressão internacional após a Segunda Guerra Mundial, foi reaberto em 1962, por ordem do então ministro do Ultramar, Adriano Moreira, destinado a militantes dos movimentos de libertação de Angola, Guiné e Cabo Verde.
O já conhecido José Pedro Castanheira, jornalista do Expresso, chamou a terreiro tal livro recente e dele extraiu a notícia de que fez título: o campo teria sido visitado por duas vezes pela Cruz Vermelha Internacional (quando?), que, segundo o relato do agente da PIDE/DGS que os acompanhou, se mostraram "espantados com as condições encontradas". De acordo com o mesmo relato, um dos emissários da Cruz Vermelha comentou mesmo que o Tarrafal "não era uma prisão mas sim um paraíso" (!).
Os responsáveis da Cruz Vermelha teriam ficado especialmente surpreendidos com "as idas semanais ao mar dos presos, as sessões de cinema, a biblioteca, as consultas ao Hospital da Praia, a possibilidade de estudar e fazer exames".
Nesta fase, e até ao 25 de Abril de 1974, estiveram no Tarrafal cerca de 230 nacionalistas africanos, tendo alguns falecido mas por razões que o autor não imputa directamente às condições carcerárias (!)
Relevo entre os tarrafalistas para quatro escritores angolanos, todos do MPLA, que ali cumpriram pesadíssimas penas de prisão: Luandino Vieira, Mendes de Carvalho, António Cardoso e António Jacinto. Quase toda a obra de Luandino Vieira, posterior ao célebre "Luuanda", foi escrita na prisão, tendo conseguido fazer sair clandestinamente os respetivos manuscritos.
O Sr. Castanheira persiste no seu nojento trabalho de formiga. Não se tem poupado a esforços para tentar ilibar a PIDE e o regime colonial do assassinato de Amílcar Cabral. As suas investidas no Tarrafal têm o mesmo objectivo: descredibilizar a verdade histórica, e os testemunhos dos seus protagonistas /heróis. Ausentes as declarações dos presos vivos constantes do livro, ausentes os testemunhos dos guardas da prisão, ele procura convencer-nos de que o autor do livro acredita na tese do Tarrafal como “paraíso”, versão PIDE ou delegação da Cruz Vermelha Internacional. .
O fascismo assim branqueado nunca matou, nunca torturou, a frigideira nunca existiu, as celas nunca existiram, a própria morte não passava da desistência da vida. E até os FdP podem ser jornalistas.
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