sábado, 20 de novembro de 2010

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A QUEIJO, COM OU SEM REPRESSÃO

O governo irlandês anunciou que irá distribuir gratuitamente porções de queijo Cheddar ás famílias que mais sofrem com as rigorosas medidas de austeridade. Segundo declarou, dia 8, o ministro da Agricultura, Bredan Smith, serão disponibilizadas 167 toneladas do queijo nacional, cuja aquisição será financiada com cerca de 750 mil euros oriundos das ajudas europeias. «Admiro o trabalho de numerosas organizações de caridade (...) e estou feliz por poder ajudar de uma maneira muito concreta», afirmou Smith um dia depois de o governo de Dublin ter anunciado uma redução de seis mil milhões de euros na despesa pública (Avante, de 18 de Novembro).

Num quadro de corda na garganta, a Irlanda resiste a pedir ajuda ao Fundo Europeu de Estabilidade Financeira. A banca local andou a especular, numa liberdade sem controlo. O modelo irlandês do mercado á solta foi muito propagandeado pelos habituais papagaios que infestam os écrãs e as ondas sonoras. O negócio correu mal e agora o Estado, todos os irlandeses, pagam a factura de brutais medidas restritivas. Quando os sacrossantos mercados espetam a faca no dorso dos politicos, estes já só imploram que a carnificina não seja fatal.

Alimentar o povo a queijo talvez seja medida de sobrevivência. E, sabe-se hoje, o queijo não afecta, antes pelo contrário, melhora a memória. Que é essencial para que algo mude.

Nos últimos dias acumulam-se na comunicação social os sinais de uma generalizada manipulação. A propósito da realização da Cimeira da NATO, em Lisboa, surgem diariamente informações, que sob a forma de ensaios das chamadas forças da ordem, multiplos comentários, previsões ou reportagens, nos anunciam ser possível violência ou ameaças terroristas na referida Cimeira ou nas manifestações que a contestam.

Vivemos no irracional reino da suspeição, onde a cor negra pode ser sinónimo de ocultas intenções, onde o direito á liberdade de expressão se igualiza à deriva destrutiva. Os organizadores da Cimeira, consciente ou inconscientemente, promoveram um clima maniqueísta onde tudo o que contesta a Cimeira, os seus objectivos, a sua ostentação imperial, o seu folclore/bailado de pequenas marionetes a brincar ás guerras de domínio /exploração, é visto como marginal, repugnante, inimigo a abater. A instrumentalização das forças da ordem ao serviço de uma estratégia, de uma subserviencia, de uma lealdade, constitui uma das piores páginas da nossa História. Sócrates nesse aspecto não é melhor do que Karzai ou Berlusconi: ridículo, presunçoso, boçal.

Daí o simbolo da Cimeira poder parecer ser o bastão e a viseira policial, o controlo policial das fronteiras, a cidade cercada internamente e externamente, o carro de combate, a restrição de circulação, a medida de excepção.

A NATO, como organização belicista, anti-democrática, e inútil para o interesse global dos povos, tem dificuldades em se legitimar perante estes e o mundo. Representa cada vez mais um poder militar ao serviço das burguesias nacionais, das corporações internacionais, do imperialismo norte-americano, crescentemente ameaçado pelo poder económico, politico e até militar de países emergentes. A sua proclamada função estabilizadora colide com a necessidade de novas jogadas de controlo de espaços, fontes de energia, rotas de comércio.

Razão tinha Lenine quando dizia que o imperialismo era a fase superior do capitalismo. Afinal que têm eles para nos dar? Queijo, com ou sem repressão, conforme os apetites. Já é altura de mudarmos de vida. Antes que eles soltem os cães.

Cristiano Ribeiro

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